Tuesday, July 31, 2007

A poética do intemperismo no estio

Intemperismo físico na visão poética de Euclides da Cunha em "Os Sertões"...

"[...]. De um lado a extrema secura dos ares, no estio, facilitando pela irradiação noturna a perda instantânea do calor absorvido pelas rochas expostas às soalheiras, impõe-lhes a alternativa de alturas e quedas termométricas repentinas; e daí um jogar de dilatações e contrações que as disjunge, abrindo-as segundo os planos de menor resistência. De outro, as chuvas que fecham, de improviso, os ciclos adurentes das secas, precipitam estas reações demoradas".

Tuesday, July 24, 2007

O todo e a parte

Reproduzo uma pequena passagem de Pascal que encontrei no último livro de André Comte-Sponville [A vida humana, p. 15]:

Quando considero a pequena duração de minha vida absorvida na eternidade precedente e seguinte, o pequeno espaço que ocupo ou mesmo que vejo, abismado na infinita imensidão dos espaços que ignoro e que me ignoram, assusto-me e me espanto de me ver aqui e não lá; pois não há razão por que aqui e não lá, por que agora e não então. Quem me pôs aqui? Por ordem e conduta de quem este lugar e este tempo me foram destinados?”

Monday, July 23, 2007

Transformando o Plano Diretor de Florianópolis

O texto a seguir (de minha autoria) foi publicado na edição de hoje (segunda-feira, dia 30 de julho) do Diário Catarinense, com algumas pequenas modificações. O que pode se ler a seguir corresponde à versão integral do texto, ligeiramente mais longa...

"Depois da “operação moeda verde” em Florianópolis, esperam-se mudanças nas práticas de gestão e de ordenamento (zoneamento) de uso do solo da cidade, e isso só pode ocorrer na medida em que se mude a maneira como se formula (e se altera) o Plano Diretor. É isso que precisa fundamentalmente mudar, já que à exigência da existência de um Plano Diretor, não corresponde, todavia, a exigência de uma única forma de fazê-lo. Comumente, a formulação (e alteração) de um Plano Diretor inscreve-se na forma de governar a cidade. Assim, não é incomum que a forma de governar seja inspirada em um modelo mental do tipo “comando e controle” que, no exercício do poder, manifesta-se pela fragmentação dos problemas, reduzindo a sua complexidade pela divisão em (muitas) partes para melhor comandá-las e controlá-las. Mas este modelo revela-se cada vez mais inapropriado para governar nossas cidades, e Planos Diretores nele orientados são operacionalmente frágeis e sujeitos a todo tipo de alterações casuísticas. Planos Diretores assim formulados passam a falhar sistemicamente e, desta perspectiva, as irregularidades apuradas pela “operação moeda verde” são um sintoma desta falha sistêmica. Portanto, Planos Diretores precisam ser formulados a partir de um outro quadro de referência. Cidades precisam ser percebidas como complexos sistemas de atividades humanas, onde os processos de tomada de decisão não podem mais ser orientados por um modelo do tipo comando-controle, já que as cidades comportam um sistema de problemas interconectados que não podem e não se deixam decompor em problemas mais simples. Portanto, é de uma perspectiva sistêmica que um Plano Diretor precisa ser formulado. E desta perspectiva, um Plano Diretor precisa deixar de ser somente uma sentença do que pode ou não pode ser feito na cidade, sob pena de ser notoriamente efêmero, para se tornar, para o Poder Público e para a Sociedade, um instrumento, uma plataforma duradoura de apoio à tomada de decisão, capaz de permitir a mediação e a acomodação (gestão) de conflitos. Para isso, o Plano Diretor precisa se transformar em um sistema de aprendizagem para a ação efetiva, capaz de lidar com a complexidade, tornando-se, assim, mais apropriado “à ordem da realização democrática” e republicana na cidade."

Thursday, July 12, 2007

Fronteiras...novamente!

Na Folha de São Paulo do dia 8 de julho de 2007, há uma longa entrevista (pág. A16) com Sérgio Serra, designado embaixador do Brasil para mudanças climáticas. Quando perguntado sobre a opção pela energia nuclear no Brasil, o Sr. Serra afirmou que "como embaixador extraordinário para mudança do clima, eu posso dizer que a energia nuclear não emite CO2". Quais os limites de validade desta afirmação? Certamente depende de como se estabelece a fronteira do sistema de interesse...

Monday, July 02, 2007

Qual é a realidade da realidade?

Recentemente, recebi um exemplar do livro Response Ability, de Frank Fisher (Melbourne: Vista Publications, 2006. 315p.), que reune uma série de artigos deste autor sobre a "construção social da realidade". [...]. No entanto, o "modelo-padrão" (default) é bem diferente deste entendimento, como bem exemplifica a coluna de Marcelo Gleiser no caderno Mais! da Folha de São Paulo do dia 24 de junho (de 2007). No artigo intitulado "A emoção do não-saber", o físico brasileiro, representante de uma tradição epistemológica positivista, afirma que "jamais poderemos ter uma descrição completa da realidade, pelo simples fato de que jamias poderemos vê-la por inteiro. Estamos condenados a uma visão míope do real". Isso é a revelação mais clara da crença segundo a qual o mundo resulta daquilo que se pode medir. Então, note bem, a nossa "miopia" decorre das limitações de nossos órgãos sensorias e de suas extensões - os equipamentos dos cientistas - em medir. É a crença na existência de um mundo objetivo. [...]. Mas vários outros autores não só apontaram as limitações deste entendimento (desta epistemologia), como demonstraram que a "realidade" do mundo resulta de uma construção, como por exemplo o biólogo chileno Humberto Maturana.